A jibóia e o elefante

Tenho andado com o desenho do Principezinho na cabeça, aquele que os adultos acham que é um chapéu: o desenho da jibóia que engoliu um elefante, sou eu e o luto do Tomé... Um elefante maior do que eu e que agora está dentro de mim e me faz esticar, esticar para lhe dar espaço e poder digeri-lo.

O calor está a chegar, os projectos está a avançar e a mim só me apetece parar.
Pergunto-se se sei onde vou, se estou onde preciso estar e não sei.
Só sei que estou cansada e que preciso de respirar, preciso de me ouvir, preciso de tempo para sentir.

E hoje tive o privilégio de ter conversas maravilhosas em que ouvi, fui ouvida e fui ajudada a ouvir-me e a sentir; 

uma pelo telefone com uma amiga que no fim antes de se despedir me diz: 
"só perguntei pelo Isac e pela Bianca, mas agora sinto que também posso perguntar pelo Tomé, como está o Tomé?" 
e eu dou por mim a responder-lhe com toda a facilidade, mesmo que cheia de dúvidas, como teria se ele estivesse aqui: acho que se calhar isto, se calhar aquilo, tenho medo que isto, gostava que aquilo... porque se ao principio me parecia muito estranho ter sensações contraditórias em relação a como o Tomé pode estar, agora começo a reconciliar-me com a ideia que onde quer que ele esteja pode tal como eu estar simulâneamente ótimo e péssimo, cenas que podem não ser só humanas...

 "Assim como em cima, é embaixo. Assim como embaixo, é acima.",     dizia o Hermes.  

outra pelo chat do facebook, onde ao contrário do que consta, se fala também de coisas muito sérias... sobre as mães se culparem sempre do que sucede com os filhos, de se acharem as super mulheres e de como isso é natural e inevitável. De como sentimos perto as pessoas que nos dizem que perdemos. De como as mortes são anunciadas de tantas formas e como as pessoas na nossa vida também muitas vezes surgem antes de as conhecermos, de como uma tatuagem com as cores erradas pode ser um prenuncio de um amor certo (espero um dia conseguir que esta história seja aqui partilhada). De como o mérito nisto é o de continuar a andar mesmo quando não sabemos para onde. De como de algum lado chega força nem que seja só para mais um dia. De como 
a vida é curta, o amor é mais forte que a morte e estamos sempre ligadas às pessoas que amamos. 
Partilhámos os pequenos, enormes milagres que só partilhamos com quem sabemos que compreende. De como os que morreram conseguem consolar-nos das forma mais extraordinárias depois da morte. Porque sempre que tenho este tipo de conversa é isso que acontece, há medida que nos abrimos vamos partilhando pequenas preciosidades, acontecimentos improváveis, as nossas bençãos enviadas por eles. 

(Entrei agora mesmo na página dessa pessoa e acabo de ver que a imagem de capa é do principezinho, tal como a que escolhi para este texto.... são estas coisas.)

E ao ser ouvida fui sendo cada vez mais capaz de colocar em palavras sentimentos que até aqui não conseguia explicar, porque o ato de ser ouvido altera a percepção de si próprio de quem fala, quando alguém segura o espaço para mim, chego mais fundo do que sózinha, consegui pela primeira vez explicar que antes da morte do Tomé eu acreditava que nós sabíamos tudo, mesmo sem saber que sabemos e nos escolhemos nesta vida, que tudo tem um sentido. Que quando o Tomé morreu quis suspender todas as crenças porque não queria que elas interferissem na minha ligação com ele, não queria procurá-lo onde ele não estivesse. De como é uma grande luta entre o que eu sei e o que tenho permissão para saber e também o medo de me iludir e por causa dessa ilusão me desencontrar dele. E assim muito simplesmente através desta conversa consegui pela primeira vez dar forma a algo que já queria e não conseguia há tanto tempo.

Falta só dizer que durante esta conversa senti o Tomé tão próximo, encostado ao meu ombro, que estive a falar com ele ao mesmo tempo, que lhe disse que pode ficar por perto tanto tempo quanto for bom para ele e não mais. Não sei se ele me ouve, mas só para o caso de ouvir. 
E pronto, são quase três da manhã, que parece ter-se tornado a minha hora normal de dormir. Falta contar uma história muito importante, mas amanhã também é dia... e hoje já quase que é de dia. :)

Comentários

Mensagens populares