A história da chouriça
Trabalhando com pessoas em crise, torna-se óbvia uma coisa:
construímos as nossas vidas sobre introjecções não digeridas de lugares comuns.
Frases que ouvimos repetidas mil vezes, na família, na escola… na comunicação
social.
A nossa realidade é tão sólida como uma folha de papel,
ouvimos dizer, lemos que, vimos no facebook, ou até vimos com os nossos
próprios olhos e tirámos as nossas conclusões. Mas será eu podemos confiar nos
nossos olhos? E se eles já trouxessem colados uns óculos distortores que nos
fazem olhar para a realidade através de uma cortina. Uma cortina de pequenas
mentiras inquestionáveis, ou verdades fora de contexto.
A história da chouriça
Duas amigas partilhavam casa, a Ana herdara uma receita secreta de Cozido, com um sabor
único e delicioso. A Rita pediu que lhe ensinasse.
Ao aprender a receita a Rita ficou espantada ao ver que a
Ana cortava as duas pontas da chouriça e as deixava de lado. Curiosa perguntou
mas a resposta não a satisfez:
- A minha mãe sempre fez assim e sem isso o sabor não é o
mesmo.
Pouco esclarecedor pensou a Rita – Ana por favor, pergunta à
tua mãe porquê.
De volta de casa a Ana trazia uma ar
satisfeito.
– Já perguntaste?
- Sim e ela disse-me o que eu já esperava: aprendeu assim
com a mãe, é um segredo de família.
- Não, não! Tudo tem uma história, por favor pergunta à tua
avó, tenho a certeza que pelo menos ela sabe.
Apesar de irritada a Ana perguntou à avó, agora também ela
começava finalmente a estar curiosa.
A resposta da avó tinha todo o sentido. – Oh querida,
cortava as pontas da chouriça porque a panela era pequena e a chouriça inteira
não cabia.
A Ana e a Rita riram juntas com esta história e finalmente…
deixaram de cortar as pontas da chouriça….
Quantas vezes cortamos as pontas aos nossos sonhos, aos
desejos mais profundos da alma porque a
tradição familiar ou social repete mil vezes que tem que ser assim?
O medo de transgredir e de quebrar as regras implícitas que não
compreendemos leva-nos a situações completamente loucas, é
o pior tipo de loucura, a loucura da normalidade: desistir de viver a vida de
maneira integra e significativa por causa de uma (ás vezes muitas) mentiras?
O meu sonho é
levar a reflectir sobre as “verdades” que governam as nossas vidas, fomentar a
possibilidade da mudança, e definitivamente mostrar a ineficácia das
tentativas de sermos “melhores”… basta pararmos de evitar viver com
autenticidade, respeitando quem somos. O que é sem dúvida o maior e mais
difícil desafio.
Como me dizia um professor: “Ser infeliz é fácil, difícil é
ser feliz.”
Mais difícil sem dúvida mas também infinitamente mais
interessante e divertido. É a diferença entre sobreviver e viver. Uma grande
diferença….
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