Please do not feed the fears


Tenho tido muitas dúvidas sobre o que fazer neste blogue. 
No inicio ele serviu principalmente para três coisas: começar a construir uma homenagem de amor ao Tomé, comunicar com as pessoas próximas e tranquilizá-las, e dar voz a mim e a outros para podermos expressar os nossos sentimentos acerca do que se passou. 
Aos poucos também desejei poder trazer à luz o tema da morte e do luto e através disso ajudar outras pessoas que estivessem a passar pelo menos, pelo menos ao sentirem-se acompanhadas.

A partir de certo momento o que queria escrever tornou-se tão intimo que me assustou. E se as pessoas pensam e dizem coisas horriveis sobre mim? e se interpretam mal o que escrevo? Será que alguém quer continuar a ler sobre isto? Quem é que eu julgo que sou para "dar lições" sobre um tema como este? 
Escrever tornou-se cada vez mais dificil, está a ser muito dificil neste preciso momento.
Fui adiando e criando desculpas para não escrever, começando rascunhos que não acabava.

Apesar disso um dia chegou o momento que eu temia, alguém que mal conheço enviou-me uma mensagem privada: "Que tal tentares começar a largar o Tomé?" Fiquei em choque, atingiu-me exatamente onde mais doi, nas minhas dúvidas.

É mesmo nos momentos em que arriscamos sair da nossa zona de conforto ou passamos por uma situação difícil, quando todos os nossos alicerces ficam frágeis que precisamos mais de quem alimente a nossa força e não as nossas inseguranças. A reação de fúria é por sentir que essa pessoa nos puxa para baixo, para um buraco que conhecemos bem, exatamente quando estamos a firmar-nos nos nossos pés e a tentar manter-nos a salvo. 

Se tenho dúvidas? Carradas delas todos os dias. Se estou segura se estou a fazer o melhor por mim, pelo meu filho e pela minha família? Não. E por isso que são graves este tipo de intervenções, porque abalam um equilíbrio e uma clareza que já de si é difícil de manter. E por isso são cruéis e magoam.
 

Acho que só acredita que estamos bem quem já esteve connosco. È chocante para algumas pessoas estarmos bem. Eu também me pergunto muitas vezes se estaremos mesmo bem, mas acho que nunca estive tão lucida na minha vida, nem com tanta coragem para fazer o que tem que ser feito e dizer o que tem que ser dito. Sou capaz pensar cada vez mais pela minha cabeça e sentir o que sinto. É uma prenda do Tomé. Se estamos bem? Eu diria que sim, tanto quando possível, hoje, amanhã não sei, tal como toda a gente. Há dias falava com a Bianca, que fala do coração sempre, e que não tem medo disso: "Sabes mãe, é incrível como só passou tão pouco tempo, é como se fosse outra vida, e nesta é normal o Tomé não estar". Por outro lado eu não estou bem, como não estava antes do Tomé morrer, não gosto do estado do mundo, não gosto de como as pessoas que têm o coração aberto morrem, nem de como sofrem.

Uma parte de estarmos bem, tem a ver com acreditarmos nessa possibilidade e em termos uma tribo que acredita nisso também, senão não estaríamos, por isso é que é tão grave quando as pessoas à volta criam dúvidas acerca disso. A possibilidade de deixar de estar bem está sempre ali ao lado, por isso é tão importante reagir e responder a quem faz duvidar disso, eu diria "Do not feed the fears"

Estou cansada de ver sofrimento inútil à minha volta e começo a suspeitar que uma das principais razões é o facto de nos termos desconectado da morte, e com isso do sagrado da vida. Lamento muito, mas é normal perder filhos, ter desgostos, estar de luto. Acontece a mães, a pais, a familias ao longo de toda a história da humanidade e vai continuar a acontecer, ainda faz parte da realidade. Não sinto como uma injustiça ou algo de antinatural, antinatural como se sempre aconteceu? Calhou-me a mim podia ter calhado a outra pessoa, há sempre pessoas a quem calha esta parte da história. E lamento que tentemos fingir que é diferente, porque se não o fizessemos talvez tratassemos melhor e dessemos mais atenção e respeito às pessoas enquanto estão provisóriamnte vivas. Se eu tivesse dedicado tanto tempo ao Tomé enquanto ele estava vivo como dedico agora talvez tivesse feito diferença, mas eu achava que tinha tempo.

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