Coisas das crianças . Bianca


“Tem sido mais fácil e mais difícil ultimamente, uma das coisas mais difíceis é que está realmente a ser mais fácil.” – Fátima Marques 

É verdade. Cada vez estou melhor, cada vez me sinto melhor, cada vez aceito melhor e isso, de certa forma é ‘complicado’ sentir. E quando até com isto te sentes bem e com muito mais tão difícil de imaginar, ainda mais difícil de experienciar… A mim vem-me esta questão: Eu não quero ficar triste nunca enquanto estiver a pensar nele, quero sempre lembrá-lo com felicidade. E tenho, neste momento consigo ter/sentir, muito mais felicidade por tê-lo tido comigo, do que tristeza por tê-lo visto partir. E também isso demonstra que por maior que seja a dor de ver alguém que amamos incondicionalmente deixar de estar fisicamente presente connosco, independentemente de haver algo após a vida que conhecemos ou não, a felicidade de o ter tido é tão maior. E que nunca nunca trocaria essa felicidade de o ter tido pela não tristeza de não o ter mais à minha vista, ao meu toque. 

Comentei já com a Sofia que eu, sendo imensamente emocionalmente apegada a objectos materiais, bastava que o Tomé me dissesse que gostava de algo que eu não hesitava em dar-lho. E isto parece estúpido: objectos materiais. Mas cada um com as suas pancadas e eu tenho a mania de criar laços/emoções com os objectos porque simbolizam algo para mim. Isto nada tem a ver talvez, apenas uma partilha de um pensamento. Sei, por estórias contadas mais tarde que ele terá feito o mesmo comigo. E falo dele como qualquer outro meu irmão. 

Eu amo o meu irmão Isac, amo a minha irmã Margarida, amo os meus pais, a minha namorada (felizmente, pois nem sempre estamos numa relação de amor com os nossos companheiros) e muitos outros e gosto muito de muitas outras pessoas e não tenho medo de dizer, mais assustador ainda, não tenho medo de dizer-LHES. Tenho medo de não lhes dizer vezes suficientes – é mesmo esta a frase, sei que já a viram/ouviram em vários filmes/textos, mas a verdade é que não sou a primeira a senti-lo ou escrevê-lo e algumas dessas pessoas que o sentiram/escreveram chegaram a muitas pessoas tal como a vocês. 

E é engraçado este texto da minha mãe ter-me dado vontade de escrever porque antes de chegar a casa e lê-lo vinha a escrever no telemóvel pelo caminho um outro. Adoro quando percebo que ainda tenho coisas das crianças. E quando digo isto não coisas de criança, mas sim coisas das crianças. Coisas que nunca deveríamos ter deixado que nos levasse, coisas importantes. É das que eu mais gosto na Sofia. Ela tem coisas de crianças. O entusiasmo por exemplo. Adoro o seu entusiasmo das crianças. Alguma coisa não lhe foi roubada e faz com que os seus olhos continuem a brilhar exactamente como o das crianças. É das coisas que mais admiro na minha mãe. A sua inocência de criança terrivelmente devastada pelos ‘adultos’. É das coisas que mais admiro na minha prima Catarina ainda uma ‘criança’ que com toda a naturalidade responde à sua irmã de 3 anos não fales do Tomé agora que eu não quero ficar triste. Ou quem me dera que o Tomé ainda aqui estivesse. A sensibilidade de uma pessoa pura como a da minha irmã de 10 anos. Não vamos pedir às nossas ‘crianças’ que deixem de ser. Que não chorem, que não olhem, que não toquem, que não digam. Vamos educa-las não como crianças, mas como seres humanos mais pequenos, puros e inocentes. Explicar as coisas com simplicidade quando fizerem perguntas, elas vão perceber. 

E a minha tia Susana tem duas filhas tão lindas não pelos seus olhos azuis e verdes, mas pela educação/liberdade que lhes dá e tudo mais. Por não precisar de lhes explicar friamente o que é a homossexualidade, mas mostrar-lhes um filme sobre o amor de duas princesas. De ser a primeira a perguntar se elas têm perguntas e não impor-lhes de imediato uma resposta. Acima de tudo tentar entender o que cada uma é não tentar que cada uma (ou as duas) seja. Atenção que adoro também que o meu pai me tenha tornado um ser capaz de viver neste Mundo. E há um equilíbrio que devemos encontrar e que eu encontro a meio caminho entre a minha mãe e o meu pai. E o equilíbrio de cada um será diferente e num caminho diferente ou igual, não importa. Sabe bem encontrá-lo. 

“A minha filha disse-me uma coisa muito importante, é preciso chegar a um dia em que não queiramos voltar atrás… não trocaria nada, não fugiria de nada.” – Fátima Marques 
Tive hoje um sonho, hoje porque acordei de manhã e voltei a adormecer. Em que o Tomé voltava. Foi muito estranho porque normalmente tenho total consciência de que estou a sonhar durante um sonho e desta vez não a tinha, não foi a única vez, mas a primeira. que me lembre, em que o Tomé entre num sonho. E ninguém tinha voltado atrás. Ele tinha voltado aqui. E tudo o que eu mais desejaria era que ele voltasse para aqui, para junto de nós. Mas voltar atrás. Voltar atrás não me parece certo desejar voltar atrás, não que haja um certo ou errado. Eu sinto que não é suposto voltar atrás. Não sei o que faz sentido, nem tão pouco sei bem o que sinto porque esse sentimento se altera constantemente. Sei que estou bem. Estou bem com o Tomé. Estou bem comigo. Choro. Lá está, como as ‘crianças’ porque faz bem chorar. Tenho saudades, mas estou bem comigo e com ele e com todos. E sinto, seja verdade ou mentira faz-me bem sentir isto, sinto que não é o fim. Adoro cada vez que tenho lembranças com ele.

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